(Vandeia Ramos)
Alguns estudiosos afirmam que os evangelhos são a história da Paixão-Morte-Ressurreição com um longo prólogo. “Foi para isso que Eu vim”. Há um caminho que os evangelistas traçam, da genealogia, Encarnação, todos os quatro encaminhando a narração para a Cruz.
A Palestina, por onde Jesus andou entre nós, era uma área de passagem entre a Europa, Ásia Menor, África e Mesopotâmia. Comércio internacional por mar ou por terra. Desde o século IV a.C., com a conquista das terras por Alexandre Magno, o helenismo se espalhou, tornando a língua grega referência de status social e meio de comunicação entre os povos. O Império Romano a absorveu no seu cotidiano. Assim, é comum vermos gregos na Palestina e a língua era tão importante que todo o Novo Testamento foi escrito em grego – ainda que o pensamento seja semita, dos povos originários da região, como os hebreus.
Além de muitos pagãos terem admiração pelo Deus de Israel, os judeus tiveram momentos na sua história de dispersão. Podemos observar no caminho de Paulo em novas cidades: buscar primeiro a sinagoga. Havia uma contribuição anual que todo judeu deveria oferecer ao Templo e as festas eram momentos privilegiados para que um representante da sinagoga levasse as doações. Assim, temos Jerusalém com inúmeros peregrinos na Páscoa, como em Pentecostes.
Pelo Evangelho de João, sabemos que a vida pública de Jesus durou três anos, pois Ele se dirige a Jerusalém em três Páscoas. E esta seria especial, pois Jesus sabia que o Sinédrio já tinha decidido por sua morte. Mas Ele foi mesmo assim. Sabia o que esperar.
Assim entendemos a presença dos peregrinos, o interesse por Jesus que muitos já tinham levado a conhecimento de sinagogas distantes… Não chegam direto. Buscam apoio em quem pode ajudar – Filipe, de Betsaida, cidade pesqueira da Galileia.
O Evangelho de João destoa no estilo dos demais. Ele já começa apresentando Jesus como o Logos, que veio ao mundo para nos salvar. E segue a narrativa com Jesus chamando os apóstolos, os sinais do Reino e o anúncio da Paixão. Para o evangelista, a cruz é o trono, fazendo paralelo entre o Cordeiro pascal israelita e o Rei dos Reis, nos objetos e horários. Assim, no último discurso, Jesus vai orientar os seus de que devem amar como Ele os ama.
A Cruz é o encontro do amor humano com o amor de Deus, que segue confiando em Deus mesmo quando tudo parece contradizer. Que o Cristianismo é algo pelo qual se morre. Que mostra para todos, de todos os lugares e tempos, que Jesus está preso na cruz, entregando-se totalmente por cada um de nós – suas mãos não castigam, do alto perdoa, seus pensamentos são cravados por espinhos, seus pés um sobre o outro sem poder caminhar. É Deus nos mostrando que segue nos amando, ainda que tenhamos cometido a maior agressão a Ele ou a alguém.
A glória de Deus é este amor gratuito, que independe de nosso mérito, de algo que possamos fazer, falar e sentir. É a obediência do Filho que recebe com amor o que o Pai lhe apresenta, oferecendo sua obediência e confiança.
Para nós, a cruz se torna salvação e julgamento. O modo como nos portamos frente à cruz nos diz quem somos, seja a cruz de Cristo ou a nossa específica. Em momentos de dor e sofrimento, onde estamos? Somos o Povo da Cruz! O modo como nos oferecemos e nos relacionamos no dia a dia com Deus, agimos junto aos irmãos, nos diz nossa postura frente à dor do mundo: se temos um coração de pedra ou de carne – e carne nos remete à Encarnação, ao Corpo de Cristo Igreja e Eucaristia.
Nesta quaresma, peçamos a São José que não nos deixe afastar de Jesus e de Maria, na cruz nossa de cada dia. E que interceda a Jesus, para que nos conserve com um coração sempre novo.